Nosso Cantinho O IMPACTO 13.09.2014 – Maurinho Adorno
“Esse país só tem ladrões.
Decidi: vou anular meu voto!”
Um amigo deve lançar brevemente um livro de “causos”, fruto de anotações feitas em bares e botecos nos últimos 40 anos. Tive acesso aos originais e achei o maior barato, até porque conheço a maioria dos personagens. O hábito normal das pessoas é frequentar os botecos nos fins de semana, entendendo por fim de semana as sextas, sábados e domingos. Eu fujo um pouco à regra: vou religiosamente às segundas-feiras ao Boteco do Jorge, lá na Rua Santa Cruz, e meus amigos próximos sabem disso. E tal qual meu amigo, escuto assuntos variados e “causos”, muitos deles transformados em crônicas.
Mas, existe também papo sério nesses ambientes. Nesta semana, estive com alguns amigos nesse encontro, justamente no horário eleitoral gratuito para os candidatos à presidência. Como o boteco estava soltando gente pelo ladrão, três conhecidos – não amigos necessariamente – também sentaram à nossa mesa, democraticamente. Naquela noite, os jornais televisivos, Bandeirantes e Globo, iriam apresentar mais uma rodada de pesquisas eleitorais, com as variações de preferências ainda tão próximas, de forma a não se conseguir identificar, por enquanto, quem sentará na cadeira presidencial do Palácio do Planalto.
O boteco é um espaço democrático, especialmente porque nele comparecem pessoas variadas. De cara, achei que os três conhecidos eram do meio rural: um usava chapéu, outro tinha um canivete dependurado no cinto, em um estojo de couro. O terceiro, novo ainda, tinha a face enrugada, marcas do castigo do sol, provavelmente adquiridas em capinação de sua roça. Não demorou muito a confirmar minha suposição, quando começaram a falar do preço da caixa de laranjas: eram proprietários rurais.
O “Jornal Nacional” divulgou a pesquisa, dando empate técnico entre Marina e Dilma, e Aécio em queda. Logo, um dos sitiantes usau da palavra, com seu vozeirão, denunciando ser descendente de italiano:
– Vou anular meu voto. Não voto em nenhum deles. Ninguém fala nada da agricultura, ficam só agredindo um ao outro.
Como na mesa todos podem – e devem interagir – dei minhas considerações:
– Eles devem ter um item sobre o rural em seus programas de governo, principalmente falando sobre a agricultura familiar. Acho que o senhor não deve anular seu voto, analise os candidatos e vote no menos pior.
Nem terminei minha fala e outro falou alto:
– Prá mim ninguém presta, também vou anular meu voto.
Eu percebi que não conseguiria dissuadir esses dois conhecidos, pois estavam firmes em suas decisões. Gustavo, filho do Jorge – dono do Boteco – acionou o controle remoto e mudou para a Bandeirantes, para assistirmos ao debate. Logo estavam lá, todos de frente para as câmeras, inclusive o Levy Fidelix, o homem do aerotrem. Não perdi a oportunidade de fazer uma piadinha: “se o Fidelix for eleito, Mogi Mirim precisa pedir a ele um aerotrem ligando a cidade com Martim Francisco”. Todos riram. Um deles completou “ele deve esticar até meu sítio”.
O debate ia bem até a Dilma dizer que os governos do PT combateram a corrupção, com mais investigações feitas pela Polícia Federal do que qualquer outro governo deste país. Um dos presentes saiu com essa:
– Ela se esqueceu de falar sobre o Mensalão e dos petistas que estão presos. Deveria falar também das denúncias do ex-diretor da Petrobras, hoje preso por participar de um esquema, destinado a dar propinas a políticos.
Outro amigo, petista, disparou:
– Ela deveria falar dos roubos na concorrência para compra de trens pelo PSDB em São Paulo.
Um dos ruralistas assacou:
– Esse país só tem ladrões. Decidi: vou anular meu voto.
Pensei comigo: falar o quê? Eu me despedi e saí.
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