Nosso Cantinho O IMPACTO 29.11.2014 – Maurinho Adorno
Eu gostaria de ter
a experiência de ser avô
Na novela “Império”, o personagem, José Alfredo de Medeiros, interpretado por Alexandre Nero, fica empolgado com a notícia de ganhar um neto, fruto de um relacionamento nada convencional de seu filho João Lucas (Daniel Rocha), com a Lu, interpretada por Josie Pereira. Vendo o capítulo em que ele se comporta como uma criança, tamanha a felicidade, fiquei imaginando o amor entre avô e neto. Esse amor incondicional não ocorre apenas na ficção, mas é constante também na realidade, e o diga meu amigo Toninho de Oliveira, após a chegada do Fernando.
Não sou avô, pelos simples fato de meus dois filhos ainda não terem se casado. Em nossas conversas, ambos dizem da vontade de ter seus filhos, ou seja, meus netos. Espero apenas ter tempo para conhecê-los nesta vida, mas não consigo imaginar meu comportamento em relação a eles. É um relacionamento novo, imprevisível, embora saiba que os velhos se rejuvenescem com essas criancinhas. Dizem que, por mais sérios e austeros que sejam, os avós se derretem ante os netos Com certeza, revivem os momentos em que embalavam seus filhos.
Como não tenho netos, fico tentando relembrar os momentos em que convivi com meus avós. Do lado materno, não conheci meu avô, ele morreu quando eu tinha apenas um ano de idade. Já com minha avó Sophia, eu tive oportunidade de conviver por bons anos. Era austera e firme com todos nós, e eu a fazia rir com minhas brincadeiras. Vaidosa, toda tarde tomava seu banho e fazia um “birote” com seus cabelos brancos compridos para, após, se sentar numa cadeira de balanço para escutar “A Voz do Brasil!”. Tinha uma vida difícil em seu sítio, até vir morar na cidade, já com idade avançada.
A minha avó materna, Antonieta, era carinhosa e dona de um rosto lindo, com pele aveludada. Mineira de nascimento, ela morou muitos anos em Mogi Mirim e depois, não sei por que motivo, resolveu morar em São João da Boa Vista. Acho que é porque lá moravam dois de seus filhos, a Olga e o Antonio – os restantes estavam espalhados. Nunca em minha vida como biscoitos de polvilho tão deliciosos como os da “Nietinha”, como carinhosamente meu avô a chamava.
Em São João, eles moravam em uma casa humilde, sob a qual passava um córrego que corta a cidade. Era interessante dormir em sua casa: de início, o medo pela correnteza do córrego, mas em pouco tempo a gente acostumava com o barulho. A noite passava rápido, pela ansiedade de um novo dia e das novas brincadeiras com os primos, especialmente a Vera, a espoleta da família, para usar uma classificação daquele tempo.
Meu avô Astolpho era singular: era conversador, usava botinas, lenço no pescoço e um cinto largo, daqueles de boiadeiro, com um estojo de canivete. Ele não era só boiadeiro, mas também comerciante de gado. Percorria sítios e fazendas no Sul de Minas e depois tocava a boiada até Mogi Mirim, confinando numa chácara que possuía nos altos da Rua Santa Cruz, onde a família morarou por muitos anos. Depois ia vender aos açougues da cidade e os entregava no Matadouro Municipal, defronte ao “Pedro Ferreira Alves”.
Minha mãe contava que a propriedade era um campo de descanso de soldados que vinham de cidades distantes, e até de outros estados, para combater na divisa de Minas, na Revolução Constitucionalista de 1932. No local, as mulheres cozinhavam para eles e também costuravam suas roupas. Era a forma de colaborarem com o movimento. Algumas meninas se engraçavam com os soldados – muitos voluntários – e algumas delas acabaram achando o príncipe encantado.
Esse meu avô Astolpho era especial e se dedicava a ajudar o próximo. Como não tinha recursos financeiros para ajudar as famílias carentes de São João, saia às ruas catando papel, papelão e garrafas, depois os vendia e destinava a renda aos pobres. Esse desprendimento despertou a curiosidade do bispo Dom Thomaz Vaqueiro, e ambos ficaram amigos, ao ponto de nas bodas de ouro, comemorada numa casa simples e pobre, o religioso foi abraçar meus avós. Saudades. Era bom ter avós.
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